Na sessão de apresentação da obra em Braga, Maio de 2011
É para mim uma experiência nova, esta de subitamente passar para o lado de lá. O lado que não é o de quem escreveu e submeteu a sua obra a uma crítica, seja ela académica, jornalística, de café ou, como acontece ser o caso, a de alguém a quem o autor pediu que lhe fizesse uma apresentação, que é o que a Eugénia me convidou para aqui fazer, o que, devo dizer, depois de ler “Zapping sobre as madrugadas idênticas”, me deu grande satisfação e uma pitada de orgulho.
Estou habituado a participar neste tipo de sessões, não como apresentador ou comentador, mas como autor. Não sendo um teórico do assunto e muito menos querendo postular, consigo talvez fazer alguma teleologia sobre as formas de apresentar um livro, o que advém do facto de ter assistido a umas boas dezenas de apresentações de livros meus, levadas a cabo por diferentes amigos, desde colegas que também são escritores a académicos, desde jornalistas a activistas sociais, passando por sociólogos e filósofos, historiadores e um realizador de cinema.
Fruto desta experiência, diria que há talvez um primeiro tipo de apresentação, que eu diria ser a de intervenção, e onde se procura detectar na obra os seus factores de desassossego e dela retirar aqueles aspectos que podem contribuir para a inquietação social e, assim, para a mudança.
Há também as apresentações de sentimento, que têm por objecto todo um conjunto de emoções que poderão ser despertadas no leitor.
Há, por último, as de contexto, que têm como preocupação inserir o livro no devir, no movimento histórico.
Certamente que as academias literárias poderiam encontrar inúmeros outros formatos e, até, eventualmente, estar em desacordo com a divisão que acabo de fazer. Repito, sou apenas um escritor e uma pessoa minimamente atenta; estou apenas a falar daquilo que é fruto da minha observação directa e tenho zero preocupações especulativas, reduzo-me à minha insignificância, portanto.
Tudo isto para dizer que o tipo de análise que, em minha opinião, melhor se adequa a “Zapping Sobre as Madrugadas Idênticas”, é esta última, a de contexto. Trata-se de uma opinião a que, reconheço, não será alheio o facto de esta ser a área que mais me excita: o tempo e a sua influência na pessoa, ou, se quiserem, para recorrer ao título de Heidegger, “O Ser e o tempo”. Para além disso, tem também a vantagem de nos resolver o difícil binómio que é o de falar na obra sem a revelar: integramo-la, assim, no seu tempo ao invés de falar da obra em si mesma.
Independentemente do meu próprio contexto, creio contudo que “Zapping Sobre as Madrugadas Idênticas” apela a este tipo de análise. Apela, quer pela sua estrutura interna, quer pela temática, quer ainda pelas preocupações que revela.Pela estrutura interna, desde logo, porque é um livro que se passa em duas épocas distintas. Isto apesar de, curiosamente, ter apenas um narrador. Por um lado, temos aquelas que são as metafóricas madrugadas dos inícios do século XX, quando a humanidade enfrentava aquela que era a guerra mais mortífera e destrutiva que jamais vira, a primeira. Pelo outro lado, temos as madrugadas de hoje, envoltos que estamos num sistema que é talvez o mais destrutivo da humanidade do ser humano. (...)
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