Que caminho se está a indicar a esses jovens? Será o caminho empreendedor que ouvem na propaganda do sistema? Ou será aqueloutro que vêem no funcionamento real desse mesmo sistema?
Muito se tem falado de negócios e
negociatas protegidos à sombra do Estado. Negócios que são feitos, não porque acrescentem
valor ao país, mas simplesmente porque a disponibilidade orçamental existia ou
foi criada numa qualquer alínea, quase secreta, transformada num segredo bem
guardado e com um destino bem orientado.
Muito se tem falado também de
entradas e saídas da política para as grandes empresas e das grandes empresas
para a política, numa dança em que o decisor e contratador público de hoje é o
contratado privado de amanhã.
Regra geral, abordam-se estas
questões do ponto de vista da moralização, da justiça, do caso de polícia.
Completamente de acordo, mas faço
um esforço para ser pragmático, para perceber os reais prejuízos que daqui advêm
para o país.
Alguns, como Paulo Morais, conseguiram
demonstrar que não teríamos a excessiva dívida pública, não fossem tais
relações promíscuas entre os mundos da finança e da política.
Não tenho dúvidas de que assim
seja.
Contudo, o impacto mais grave
parece-me estar no exemplo. Não há jovem que hoje não seja bombardeado com
conceitos e modelos de empreendedorismo. Na escola, na Universidade, em ações
de formação: dizem-lhes que têm de ser empreendedores para terem sucesso, que
têm de ser empreendedores para contribuírem para um país melhor, que têm de ser
empreendedores para estarem ao nível dos melhores. “O empreendedor tem o futuro
do seu lado”, garantem-lhes, para logo lhes dizerem que para isso têm de ser
inovadores, têm de criar ideias, produtos, coisas que sejam necessários e que ninguém
tenha imaginado… enfim, chega a ser quase uma lavagem ao cérebro.
E no entanto, neste sistema em
que a medida do sucesso é a do ganho financeiro, que exemplo lhes dão os mais
graúdos? Que não é importante serem inovadores, que não é importante pensarem
nas reais necessidades do mercado. Que se foda o cliente, o importante é estar
bem relacionado. Que se foda o produto, o importante é entrar num partido e
trepar por aí acima. Viva a economia de tráfico que a de mercado é para os tolos!
Os jovens de hoje olham para um
lado e para o outro. Dum lado, vêem muitos do que correram o risco empreendedor
fecharem portas acossados por uma máquina fiscal que inverteu os mais
elementares princípios do Estado de Direito, acossados pela concorrência
desleal dos que, sendo protegidos pelo sistema, invertem as regras do jogo. Do
outro lado, vêem os traficantes de influências prosperarem duma prosperidade
cada vez mais imoral e descarada.
Que caminho se está a indicar a
esses jovens? Será o caminho empreendedor que ouvem na propaganda do sistema? Ou
será aqueloutro que vêem no funcionamento real desse mesmo sistema?
Há exceções? Há. Hás bons casos
de sucesso? Também. Mas uma economia, uma sociedade, não se fazem de exceções,
fazem-se da média.
Este exemplo asqueroso é talvez a
pior consequência que tudo isto terá no futuro de Portugal. Mostra-se o contrário
daquilo que se ensina. Propaga-se um estilo de sucesso que foi o que nos arrastou
para este precipício. Condena-se o país a prosseguir numa economia de circuito
fechado que, ao invés de criar valor, o destrói.
Recentemente, estive numa prisão
peruana a entrevistar jovens correios de droga portugueses. Um deles,
falando-me dos guardas prisionais, dizia-me o seguinte: “os que dizem que vão
fazer de nós bons cidadãos, são os que vemos serem mais corruptos”. Por fim
desabafava: “é irónico mas é assim”.
Parece Portugal, “é irónico mas é assim”
Luís Novais