domingo, 5 de novembro de 2017

CANTAM HOSANAS CELESTES PARA SI, ACENDEM FOGUEIRAS E MASTURBAM-SE NOS OUTROS



Não se entende aqueles que, por um lado, querem a emoção cristã e a razão kantiana para si, ao mesmo tempo que o ódio de Torquemada com a razão de Maquiavel, para os outros.

Tenho assistido a tantos debates contraditórios sobre a questão catalã, que sinto necessidade de fazer algumas precisões. Não há maior falta do que aquela que cometetemos contra nós mesmos, contra o nosso pensamento, contra as nossas convicções. A nossa moral é o princípio máximo da soberania do “eu” enquanto ser consciente, livre e autónomo. E é por isso que o maior dos crimes é o que cometemos contras as nossas convicções, crenças, razão e moral. Dostoievski, sempre ele, ilustrou esta ideia de forma sublime em “Crime e Castigo”.

Hoje mesmo debatia com alguém que, candidamente, defendia ter Espanha feito muito bem em impor o "Estado de Direito" aos independentistas catalães, já que tudo mais não seria do que o funcionamento da justiça. Expliquei-lhe as tristes pontuações que o reino dos Bourbons tem no que respeita à independência dos tribunais, o que aliás está bem visível na forma como o poder executivo se atreveu a antecipar a decisão dos juizes. Falei-he também no criminoso caso GAL e que, no Peru onde vivo, há um ex-presidente que está preso por uma situação semelhante, enquanto Filipe Gonzalez se passeia alegremante e tem a desfaçatez de tomar posições públicas sobre a Catalunha e outros casos.

A resposta que recebi gelou-me o sangue: “GAL – A operação Luso-Espanhola que pôs a ETA de joelhos” (não comento a referência a Portugal, que deve ser uma forma de incluir-se na gesta). A resposta foi óbvia: Quem assim pensa não pode usar argumentos de Estado de Direito contra catalãoes que têm as mão brancas, ao mesmo temp que defende ações ilegais e criminosas, que estão a milhas da margem do Estado de Direito, praticadas por governantes que ficaram com as suas tintas de sangue.

A questão é muito simples, todos precisamos de valores fundamentais e, quando não os seguimos, o primeiro crime que praticamos é contra nós própios. Não somos de ferro e falhamos, mas sei bem quais são os meus: sou emocionalmente cristão e racionalmente kantiano. Emocionalmente, jamais me renderei ao “anti-cristo” e, na razão, Maquiavel nunca conduzirá a minha moral.

São estas firmes convicções que me fazem nortear as causas que abraço. Sou pelos Direitos Humanos, sou pela “Democracia” (que é muito diferente das democracias, pelo menos de algumas) e sou pela dignidade humana, incluindo a justiça social.

Direitos Humanos, Democracia, Justiça Social, eis as sagradas constituições. Todas as que daqui não partam, são inconstitucionais. Como humanidade temos de nos pôr de acordo no essencial, e é a partir daí que podemos e devemos disfrutar das saudáveis diferenças.

No mínimo, pede-se coerência. Não se entende aqueles que, por um lado, querem a emoção cristã e a razão kantiana para si, ao mesmo tempo que pedem o ódio de Torquemada com a razão de Maquiavel, para os outros.

Estes são os piores que temos: Cantam hosanas aos céus onde sonham chegar, ao mesmo tempo que acendem fogueiras assassinas e se masturbam no outro!


Luís Novais 

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