quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Da Antroplogia à Ideologia


Recentemente, Luis Alves de Fraga, um pensador português que admiro e costumo acompanhar nas redes sociais, lançou no Facebook o desafio da busca de novos modelos económicos, capazes de darem as respostas que as ideologias do Sec. XIX já não estarão a conseguir.
Não me vou alongar na referência à sua intervenção, porque ela pode ser lida aqui. Basicamente, segundo Alves de Fraga, a seguirmos o pensamento oitocentista com a respetiva concretização novecentista, restar-nos-ia optar entre dois modelos económicos: de mercado, um, planificado, o outro. O repto era este: são necessários novos pensadores que formulem novas teorias e novas doutrinas.

Participei do repto, com um artigo que escrevi há tempos, onde defendia que os centripetismos cultural e cronológico nos impedem de encontrar respostas onde elas já tinham existido (ver artigo). A resposta que Alves da Fraga me deu, também pode ser lida no mesmo local e resumo-a nesta frase: a minha visão apontaria “para a revisitação de velhos métodos de sobrevivência que tiveram uma época e foram fruto dela”.
A minha questão é, no entanto, precedente: a preocupação com a teoria e a doutrina, não será ela mesma oitocentista? Não apontará também para a revisitação de velhos métodos? Não será essa ideia, incubada nas luzes, de que podemos refundar o mundo com base na racionalidade, a base da utopia iluminista em que ainda estamos a viver?
Ao longo da sua História, a humanidade foi capaz de construir modelos económicos e sociais que funcionavam e que, embora potenciados pela doutrina, precediam-na. A doutrina era desenvolvida e utilizada depois, quando essas mesmas sociedades se queriam tornar dominantes e impor o seu modelo antropológico. O imperialismo é filho da resposta doutrinária, portanto, enquanto a doutrina deriva da evolução antropológica.

Talvez a grande novidade do Sec XIX tenha sido essa: uma espécie de metafísica, segundo a qual uma ideia racionalizada deveria preceder a vivência (evitei propositadamente dizer “a existência”). Essa quase teologia que originou das maiores injustiças, dos maiores massacres e das maiores ditaduras a que a humanidade assistiu.
É por isso que gosto de olhar para o passado, de perceber o sentido da evolução antes de chegarmos à ditadura da doutrina.
Houve alguns portugueses temerários no seu pensamento, que procuraram formular sínteses entre os modelos de pensamento dominantes no seu tempo e as forma de vida, o mesmo será dizer que entre a ideologia e a antropologia. Entre eles, destaco Herculano, que toda a vida lutou por uma democracia sem “revolução cultural”, isto é, sem destruição de tudo o que existia para construir sobre as cinzas. Mas até mesmo Garret, na sua súbita nostalgia pelo frade, acabou por alinhar nessa ideia de que a pura racionalidade tinha levado à destruição.

Enfim, não é que eu seja um cego admirador de Calisto Elói antes da queda, sobretudo porque ele mesmo já estava eivado do tal "pecado" doutrinador. Mas lá que o prefiro aos Pereiras de Melo, isso prefiro.

E que estou eu a fazer se não a entrar nessa mesma contradição? Sou mais um dos filhos do Sec. XIX, não há como fugir a isso. Porém, não tão legítimo que não conviva bem com as contradições da minha racionalidade, quando em confronto com a minha vivência.
 
Luís Novais

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