quinta-feira, 22 de agosto de 2024

PREFERIA SER VIZINHO DE TRUMP-VANCE OU DE KAMALA-WALZ. Alegoria de uma campanha eleitoral



Um dos momentos mais devastadores para a imagem de um candidato aconteceu no dia 26 de setembro de 1960, no debate em que Kennedy perguntou em direto aos norte-americanos se comprariam um carro usado a Nixon. Para muitos politólogos, este foi o momento de viragem numa das eleições mais renhidas do século XX. O candidato democrata ganharia apenas pela margem de 0,17% do voto popular, uma diferença só superada em 2000 na contenda Bush II–Al Gore, quando o primeiro ganhou graças ao colégio eleitoral, apesar da desvantagem de -0,51% no computo geral. A mesma situação repetir-se-ia em 2016, com a vitória de Trump sobre Hillary Clinton, mesmo com uma enorme margem negativa de -2,1% do voto popular, que o próprio e a seu modo se encarregou de dizer que tinha sido falseada.

Numa contenda tão renhida como a de 1960, todos os fatores contam. Certamente um dos que contou foi esse debate e aquela pergunta contundente de Kennedy: “Would you buy a used car from this man?

Depois da Convenção do Partido Democrata que acaba de confirmar Kamala Harris como candidata à Casa Branca, parece que estamos num momento idêntico e igualmente destruidor de caráter. A pergunta saída de Chicago já não é sobre se alguém confiaria em Trump para comprar um carro usado, mas outra, igualmente fatal: "Would you prefer being Kamala's or Trump's neighbor?" Questão à qual se poderia acrescentar uma semelhante, sobre os candidatos a vice-presidentes: "Who would you choose as a neighbor? Tim or JD?"

O mote foi dado por Obama que, com a força do seu magnetismo pessoal, comparou Trump àquele vizinho que incomoda constantemente o bairro com o ruido de um soprador de folhas. Não necessitou mais do que esta frase, diga-se que muito indireta, para os americanos começarem a pensar no que seria ter o candidato republicano a viver na porta ao lado.

Esta comparação seria depois exacerbada por Tim Walz que, sem nunca mencionar Donald Trump, fez uma alegoria das relações de boa vizinhança como microcosmos da política: “That family down the road, they may not think like you do, they may not pray like you do, they may not love like you do, but they’re your neighbors. And you look out for them, just like they do for you”.

Esta questão passou a ocupar um lugar na mente de cada eleitor. As relações entre vizinhos são um clássico do cinema, e certamente todos os norte-americanos têm experiências com os bons e os maus. Olhando para as duas candidaturas, parece-me natural que a maioria associe Trump-Pence aos egoístas-problemáticos e Kamala-Walz aos simpáticos com espírito comunitário.

A imagem está criada e parece-me altamente eficaz. Só falta que a pergunta seja feita diretamente a cada eleitor, e talvez o próximo debate seja o momento ideal para que isso aconteça.

 

Luís Novais


Fotos: Do Facebook de ambos os candidatos

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