segunda-feira, 18 de abril de 2016

“VOCÊ PENSA QUE EU QUERO SER PUTA NO SEU PAÍS?”




O maior problema do Brasil é ter aquela classe política que vimos em direto. Por isso foi canja para as não menos corruptas potências mundiais interessadas em anular a sua expansão.

“Você pensa que eu quero ser puta no seu país? Se eu quisesse, ficava aqui que ganhava muito mais… não quer me dar o visto? Eu vou na Europa que eles não se importam que eu gaste meu dinheiro lá”. Este diálogo foi-me contado no Rio em 2011, por uma grande amiga que assistiu. Passou-se no consulado local dos Estados Unidos, quando o burocrata de serviço ameaçou a estudante de medicina de que talvez não lhe desse o visto para que passasse a lua-de-mel em Miami.

A economia brasileira estava a crescer, o país lançara um projeto de expansão continental alicerçado na UNASUR, ia organizar o mundial de futebol e as olimpíadas, o dólar estava a 2 reais e já se falava duma futura paridade.
 
Financiadas pelo BNDES, as empresas brasileiras iniciavam uma internacionalização dos setores secundário e terciário nunca antes vista, mormente as construtoras que prometiam pôr de pé as infraestruturas que uniriam a América do Sul, que conectariam o Atlântico com o Pacífico.

Para dar um exemplo, em Agosto de 2011 o jornal peruano “Gestión” abria com este título: “As seis construtoras de top do Brasil estão no Peru”. 
 
O Peru era o país da da América do Sul onde o sector da construção mais se desenvolvia e, por todo o lado, se viam obras públicas e parcerias publico privado, com placas que diziam Odebrecht, Andrade Gutierrez, Queirós Galvão, Camargo Correa ou OAS.

Também na área petrolífera, o Brasil estava em força neste país, pela concessão à Petrobrás de diversos lotes de exploração. E é precisamente aqui que começam a soar os primeiros alertas: Em Novembro de 2013 a companhia brasileira sentiu necessidade de desinvestir, vendendo as concessões à chinesa National Petroleum Corporation.

E depois? Bem, depois veio o escândalo Lava Jato, que respingou fortemente no Peru, com denúncias de malas cheias de dinheiro que teriam sido distribuídas por decisores locais, explicando assim a facilidade com que, neste país, as construtoras brasileiras ganhavam concessões, obras públicas e parcerias público privado.

A consequência foi imediata e não há em todo o continente uma única autoridade que tenha coragem de entregar qualquer projeto a uma empresa brasileira, deixando um vazio que espanhóis, franceses e chineses estão a tratar de ocupar o mais rapidamente possível. 

Em Março deste ano, já estava o ainda presidente do Peru em final de mandato, e ninguém entendia o que ia fazer Hollande numa visita de Estado extemporânea… Para compreender, teremos talvez de considerar a urgência em marcar o lugar vazio para as construtoras francesas, ao que se juntava o negócio dum satélite e a venda de armamento.

É preciso considerar que o Brasil estava a lançar um projeto de expansão na América do Sul, para perceber que aquilo que se  passa é muito mais do que um diferendo político interno, do que uma questão partidária, ou do que aquele patético grupo de deputados que vimos numa Câmara transformada em circo, onde o menos palhaço dos que disseram “sim” foi o único que o era. 

O projeto brasileiro, plasmado na UNASUR, colocava em causa os interesses de outras potências, num continente que é um dos maiores produtores de matérias-primas do mundo, que é uma reserva alimentar e um potentado energético. O escândalo lava jato, o impedimento da presidente Dilma, as notícias que saem em cada dia e que abalam a confiança política, as denuncias que aparecem vindas não se sabe de onde... O maior problema do Brasil é ter aquela classe política que vimos; por isso foi canja para as não menos corruptas potências mundiais interessadas em anular a sua expansão.


Luís Novais

Foto: joelfotos

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