Se a classe média foi uma das beneficiadas por décadas de crescimento
económico, agora vê-se sozinha como a grande prejudicada por oito anos de
recessão e de estagnação.
A classe média foi a grande
beneficiada por cinco décadas de crescimento do ocidente. A consolidação da sua
importância política e económica dá-se depois da segunda guerra mundial, em
grande parte graças ao papel que o Estado assume como fiel duma balança que tem
no outro prato os grandes detentores de riqueza.
O mundo entrou no século XX com a
constatação clara das tensões que os desequilíbrios sociais podiam provocar. A
revolução bolchevique e a posterior consolidação da União Soviética terão detonado
sérios alertas nas grandes praças e, passada a instabilidade
geoestratégica das duas guerras, havia que lancetar abcessos sociais. O Estado
foi o grande agente dessa mudança, assumindo um novo acordo social que já não
era apenas de soberania popular, mas também de concertação e justiça social,
assente na redistribuição dos recursos.
A Social-Democracia, enquanto síntese
que procura fundir individualismo com mutualismo, é a grande inovação
ideológica do século XX e é vencedora clara do período que vai de 1945 a 1989.
Seguiu-se a globalização, com a subsequente cada vez mais fácil circulação de
bens e capitais, o que terá dificultado o papel socialmente regulador dos Estados,
tornando-o impossível quando as relações entre os poderes económico e político
atingiram níveis de promiscuidade que já não podiam ser ocultados.
Se a classe média foi uma das
beneficiadas por décadas de crescimento económico, agora vê-se sozinha como
a grande prejudicada por oito anos de recessão e de estagnação. Veja-se o caso de
Portugal: analisadas as opções orçamentais do anterior e do atual governo, não
há sombra de dúvida de que foi e será esta classe a que mais pagou e continuará
a pagar os custos do ajustamento financeiro e das aventuras privadas.
As estatísticas são claras: O
último estudo do Credit Suisse revelou que o mundo chegou ao dealbar de 2015
numa situação em que os 1% mais ricos têm tanto como os restantes 99% da
população.
É esta erosão social que explica
o crescimento da esquerda urbana e não proletária, onde se acantonam as camadas
intermédias duma classe que se sente cada vez mais ameaçada. Temos aqui a
génese de partidos como o Syriza na Grécia, o Podemos em Espanha, o Bloco de
Esquerda em Portugal, e também do surpreendente sucesso da candidatura de
Bernie Sanders nos Estados Unidos e, num aparente paradoxo, dos êxitos de Donald
Trump ou Marine Le Pen.
A revolta da classe média, que
além de mais é justa, exige medidas de fundo e com carácter de urgência, sob
pena de estar ameaçado todo um edifício de direitos, que é o grande legado do
cristianismo, que foi modulado pelos iluministas e que consolidou a sua
vertente social após a segunda guerra mundial, graças a ideologias redistributivas
como a social-democracia ou a democracia cristã.
Se queremos continuar a viver
deste legado, não há como ficar calados. Precisamos urgentemente dum Novo Acordo
Social e com repercussão planetária.
Luís Novais
Foto: Lacomunal
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