É certo que a dupla Chavez-Maduro não alcançou os objetivos de
desenvolvimento que seriam expectáveis; mas tampouco o modelo liberal
que os antecedeu.
A derrota clara de Maduro nas eleições parlamentares venezuelanas, não deve
ofuscar as lições aprendidas com 16 anos consecutivos de governo chavista.
A vida diária no país está insustentável, com falhas no abastecimento de
bens essenciais, e à população não lhe resta outra alternativa do que passar
largas horas em filas intermináveis. Ao mesmo tempo, grassa a insegurança e a
rua transformou-se num lugar muito perigoso de frequentar.
Enquanto a nova maioria celebra vitória, e enquanto quase todos proferem
discursos sobre a falência do socialismo chavista, há que assentar os pés na
realidade. É certo que a dupla Chavez-Maduro não alcançou os objetivos de
desenvolvimento que seriam expectáveis; mas tampouco o modelo liberal
que os antecedeu.
Graças às suas reservas petrolíferas, a Venezuela é uma nação
extraordinariamente rica. Rica sim, mas até à “revolução bolivariana” a maioria
da população estava excluída do desenvolvimento e nada tinha a perder. Foram
estes que aderiram entusiasticamente aos seus governos.
Os números são claros. Segundo a CEPAL (organismos das Nações Unidas), um
ano antes da sua presidência 78% da população vivia entre a indigência (23.4%) e
a pobreza (54.5%). Em 2013, o ano da sua morte, esta cifra tinha descido para
42%, com 9.8% de indigentes e 32.1% de pobres.
Só assim conseguimos compreender consecutivos resultados eleitorais. O
comandante somava vitórias, apesar das críticas da imprensa, das vozes dos líderes
de opinião, da revolta mais ou menos silenciosa da classe média e do protesto
dos muito ricos. Porquê? Porque para quase 80% da população que vivia em
condições miseráveis, representou uma esperança, primeiro, e uma real ascensão
económica, depois. Chávez deu-lhes a dignidade que lhes tinha sido negada, por
isso o idolatravam.
Claro que o regime tinha muitos defeitos que nem é preciso enumerar, e que
foram ampliados pela inabilidade de Maduro. A própria escolha do sucessor foi
um sinal dessas debilidades: Chávez considerava-se providencial e dum homem que
assim se crê, sempre se afastam os melhores.
Neste momento, parece que pouco mais resta a Maduro do que um processo de
lenta agonia até à queda final. Mas de tudo isto deve guardar-se lição: não é
possível construir um sistema na base da exclusão.
Os que muito têm a ganhar, muito perdem se grande parte da população nada
tiver a perder. Quando a exclusão social é generalizada e o reformismo não
cumpre com o seu papel, tarde ou cedo se abre a porta à revolução; esta é a
moral da história, e não estou certo de que tenha sido compreendida por aqueles
que, dentro e fora da Venezuela, festejam o resultado eleitoral.
Luís Novais
Sem comentários:
Enviar um comentário