segunda-feira, 30 de novembro de 2015

MORREU ADÃO!


Foto: ruurmo / VisualHunt.com / CC BY-SA















Olho para mim como outro…
tento, pelo menos.
E quem vejo não conheço
e tão pouco quem me vê:
eu feito outro.
Imagino-me nesse que passeia um rafeiro:
vendo-me, dissecando-me, concluindo-me.
Já não o reconheço, ao outro agora eu:
Tão ridículo naquele andar, antes de eu-ele:
observando-me, a eu-mim.
E agora tão nada, eu,
visto por quem antes nada era.
E eu nele,
sabendo-me majestoso, imperial.
Raça pura passeando, 
ideias de mundo.
Metafísico, grande pensador:
Mão na trela,
melhor do que todos;
Outra ao bigode (antes ridículo),
universos valendo.
É com ele que percebo o nada que era,
e é nele que percebo tudo agora sendo.

Desisto de humilhação tamanha.
Regresso-me.
Na montra meu reflexo: sossego.
Na cabeça, pensamento profundo pensamento:
um poema, talvez este.
Acalmei-me: sou de novo eu-eu.
E aquele trôpego ridículo,
senhor do nada.
Esse que passeia um rafeiro pela rua:
Burlescos dois.

Mas já não consigo.
Por outro me vi,
comi do fruto:
Como vê, sei;
sabendo como vejo.
Como vejo, sei;
sabendo como vê.

Não há paraíso.
Morreu Adão!


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