segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Moinh'e vent'II

Um dia era noite.
Do dia que dia fora,
noite noite se pôs.
E dia noite ficou.

Cego de noite
e cego de mim:
não te vi.
Em vão errei

Foi noite cerrada.
Dias com dias de noite.
Tantos que nem sei.

E se por essa noit’errei:
não ignoro porquê:
sei que soube q’um dia
noite dia seria.

Errei.
E de tão errante:
acertei.
E uma noit'era dia.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Vivo presente não vivo futuro

Vivo presente não vivo futuro.

Ontem nasci: mo disseram.
Disso testemunha não sou.
Certo de q’ hoje vivo,
do mim d'ontem não sei.

Poderia amanhã nascer,
sem hoje viver?
S’amanhã nascerei,
testemunho não tenho,
nem meu nem d’alguém

Disseram-mo: ontem nasci.
E s'ontem hoje não foi:
hoje e só hoje é que vivo.

Mas d’hoje não gosto
e d’ontem já foi.

E ninguém que me deixe
amanhã nascer,
porque s’o peço
hoj'é q'o faço.

Ontem já foi.
Amanhã não é.
Vivo presente.
Não vivo futuro (dizem-me).

E eu? Serei?
Viverei?

Copacabana, 2009-12-12

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Baralhada Ordem.

Baralhada Ordem.

Grave ruído.
Contínuo ruído.
Trem’a terra.
Terrível tremor.
Ou canto d’entranha.
Terra que canta
cantando mostra.

Espantado ruído.
Qual seja?
Pássaros qu’ouvem
ruído de terra,
de terra que treme,
que tremendo canta.
Ruído de espanto.
Fogem caça
e caçador.

Deslizante ruído.
Mudo quase.
Nervoso deslize.
Que deslize?
De serpente,
que ross’a terra
e a pressente.
Qu’a ouve sem ouvir.
Desliz’a serpente
e seu encantador.

Brutal ruído.
Esmagador.
De que brutal?
Que esmaga?
Esmaga terr’e gente.
Esmag’a serpente.
Sem ouvir ouviu.
E d’ouvir agiu:
maremoto.

Terra que ruge.
Pássaro qu’ouve.
Serpente que sente.
Gente que pensa.
Mar que reage.
Alguns ouvindo,
outros sentindo,
alguns reagindo.

Esse grave ruído.
Contínuo ruído
de terra que treme.

Estranh’união
à terra que treme.

Destruição ou criação?
ser ou Ser?
Gota ou mar?
Infern’ou paraíso?

Nada absurdo
no grave ruído,
na terra que treme.
Destruind’constroi.
Baralhando ordena.

Ruído de terra.
De terra que treme.
Absurdo: nada.
Quand’à terra tornar
e o grave ruído
nada absurdo
de mim e si
ruído for.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Brisa vent’é qund’sol serena

Brisa vent’é qund’sol serena

Quisera ficar completo,
em metade de inteiro.
Essa metade eu fosse,
em meio ser eu coubesse.

Meia mulher teria,
C’a meia amante completa.
Meio pai também:
meia labuta tem de ser.

Oh, que unidade ser meio.
Meio de meio entender.
Meio pensador, poeta até.

Mas meio é-me pouco.
Quero ser por inteiro.
Inda que de meio louco,
louco inteiro acab'eu

Inda assim que louco seja.
Marido , pai e poeta.
Mas nad’e nad’em meio,
tud’e tudo por inteiro.

Será possível ou quimera?
Tantos são os elementos:
(quimera s’assim é)
Brisa vent’é qund’sol serena:
(possível se assim seja)

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Moinho e Vento

Moinho e Vento

Que dor é esta, amor.
Dor é de lembrar,
dor de esquecer
o que lembrado é.

Sei-te quem sejas, amor.
Quem sou não sei.
Só sei de mim em ti.
Só de ti em mim sei.

S' em ti busc' o que sou.
Em mim sabes qu' és.
De nós brotou mim ti.

Se mim em ti porquê?
Se fruto nosso.
Querido fruto.
Amada tu.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Remédios.

Mataram-me.
De parto brotei,
d’escola morri:
cidadão me fizeram.

Perguntaram-me?
Não. Quiseram fizeram.
E mataram-me.

Não me quis sabedor.
Sabedor me tornaram.
Só e só queria sentir.

Mas comigo não!

Quero meu parto.
Quer’a nascer voltar.
Quer’ ignorar e sentir.
Quer’ à escola fugir.

Morra bem mort’ o saber.
Saber qu’ocup’ o que sou.
Saber falso e não sentido,
não sentid’e sem sentido.

Mataram-me.
Remédios haverá?

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Creio em ciência teorias e lei

Creio em ciência, teoria lei:
Particular geral
diverso d’ uno.
Ensinaram-mo: “crê” e eu creio

Creio bem sabendo:
crendo-‘a mato.
Matá-la quero:
crer preciso.

Gent’à lei sumetemos,
crença velha renovamos:
Destino

Feridos de ciência que’stamos,
do destino descremos.
Mago destino: liberdade compra.
Mago destino: com inocênci’a paga.

Quem d’inocente se troca livre?
Antes sem culpa qu’arbitrar.
Roubaram-no: só culpa ficou

Eu não qu’eu creio na ciência,
porque crendo por crenç’a mato.
Porque suas leis rezando (teorias),
fado qu’é meu alcanço.

Assim sem da fé sofrer Auto,
à “santa” sem ofens’a matar.
Nessa lei que geral dizem,
inocência minha destilar.